terça-feira, 24 de agosto de 2010

Ela

Ela vem e me leva
E eu vou, eu vou
Ela vem e me deixa.
Ela tem um olhar...
Aqueles olhos de quem tenta decifrar tudo.
Eu olho e me deixo demorar
Olhar-céu
Castanho da noite
Poucos beijos, quase nada
E ela vai.
Ela vai de vestido rosa
Mulher e rosa numa só
quantos segredos contêm?
Ela faz
eclipse lunar
pelo arrepiar
Pra onde foram meus sentidos?
Espelhos nus no teto solar
Ela tem um querer bem
De quem quer viver também
Ela tem amigos. Muitos amigos.
Todos importantes.
Ela tem aquele cheiro
Aquele rosto, aquele gosto
Um poema concreto
Em forma e em cor.
Ela não quer namorar
Sofreu demais.
E no seu medo de arriscar
Eu me encanto e vou além
Porque ela me ensina a morrer
Quando nega, quando foge, quando cala.
Quando manda, obedeço.
Ela que sabe das coisas.
E assim será para sempre
Por isso é que para a mulher
Que se diz menina
menina-mulher
Que o poeta pobre e fraco
Oferece uma flor.
e um amor.

Abstrato Concreto

Sua forma não mostra transparência
Sua aparência é contraditória
O rico não compra pão
Nem amanhece no chão
Qual é a minha categoria
que me determina
É um abrir e fechar gavetas
De conceitos imprecisos
na contramão
da casa em construção
Subi no muro e levei um tiro
Eu estava em paz
A paz desconstrói qualquer sabor de
vitória
Então limitei o alargamento da parede
Recortei o inquebrável
Camuflei meu rosto vermelho
segurei meu coração no peito
Qual ideia?
Qual pensamento?
A ideia é o absoluto efetivo
cada absoluto em seu lugar.

Improviso

Enquanto a terra não sobe ao céu
Meu corpo não abstrai o seu
O João sem camisa
A Maria sem chinelo
O João de paletó
A Maria de filó
Não importa
Queria conhecer teu improviso
A qualquer hora
Na beira do precipício
Qual é o concreto trabalhado
Nas linhas do seu cabelo
Que tempo tem
Teu olhar ao teto (do teu tato ao teto)
Se a categoria é determinada
No fundo de qual gaveta eu parei?
Inútil pensar em aparência
Tuas mãos dissolvem minha consciência
E o vazio agudo
é o começo de tudo.

segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Saudaçoes "Leitor Imaginàrio do Futuro"!

Divagação nº 1: O tripulante do foguete.
Hoje por mais que eu tente descrever sobre o estado morfofisiológico sintético social do meu ego, poucas serão as palavras que literalmente expressarão a realidade cósmica e mística que ele se encontra.
Tenho experimentado de tudo um pouco nesta vida desde a sobriedade da ciência até a embriaguez do amor, porém, nestes últimos dias um turbilhão extremamente revolto de sensações racionais e emocionais está a abater-me os sentidos.
Creio que meu ego conseguiu perfurar a barreira limítrofe que separa o céu da terra e escapar para o infinito.
Só que é tão torpe e desvirtuado o fato que gerou este rompimento que não sei se fico feliz ou triste.
Talvez nem feliz, nem triste.
Dormente, anestesiada.
Obs: Esta divagação esta incompleta. Talvez continue num outro número.



Divagação nº 2 : Ato de amor.
O pintor olha pra tela em branco.
E vê o branco.
Vira a tela.
O branco continua sendo branco.
Absurdamente branco.
Sentimentos sucessivos de inspiração e latência o invadem quando fixa seu olhar.
Mas a tela interfere na representatividade humana do pintor.
Ele e a tela se fundem num mesmo plano superior, colorido e surreal.
Ele tenta entender.
Ela tenta se mostrar.
Nua, completamente nua parada em sua frente, ele em pé.
Súbito toma uma decisão.
Parte pra conquista.
Muda o lugar, a luminosidade.
Os sentimentos sucessivos inconstantes transformam-se em um único e obsessivo desejo.
Cravado.
Radical.
Não muda mais a posição.
Começa a surgir na mente a forma, sucessivamente a cor, depois o sentido, o objetivo.
A tela esta ali, nua.
Pronta pra ser tocada em pinceladas suaves e intensas.
Ele se perde em divagações, sobe até outro mundo, cai e mergulha no meio do redemoinho.
Encosta na terra.
Dança livremente no telhado molhado de chuva.
Grita, chora, sorri.
Sussura, estremeçe.
Se esqueçe.
E devagar ele veste a tela.
Termina seu trabalho com o completo sentimento de missão cumprida.
Senta e fica observando cada detalhe, cada curva, cada relevo, cada centímetro quadrado.
Acende um cigarro.
Contempla.
Pega seu chapéu e sai pra tomar um café num bar qualquer.



Divagação nº3: A crise existencial historiográfica.
Tudo aqui nesta casa parece normal. Quadros na parede. Luz indireta de luminária num canto estratégico da sala. Cozinha com duas bicicletas encostadas na parede ao lado da porta. Em cima da mesa está pintado a impressão de um luar, podendo significar também um pôr-do-sol. Cadeiras de madeira das quais uma segura a porta para não bater. Na outra cadeira falta um pedaço das madeiras do acento formando um vão entre o final da bunda e o começo da perna, nada mais natural. A lavanderia por sua vez tem obviamente baldes, panos de chão, produtos de limpeza, roupas dependuradas no varal, mesa, cavalete e tintas dos mais variados tipos. È uma lavanderia misturada com atelier de artista plástico egocêntrico no começo de carreira. Tudo tranqüilo. Sossegado.
Na parte de fora da casa fica pendurada a rede. Nos ganchos um fio de varal, (que não é realmente um fio de varal tradicional) com uma única peça pendurada que é uma capa de colchão. Tem uma bola de futebol americano e uma bola de basquete no chão da sala. Um vaso de vidro cheio de papéis em forma de recadinhos, uma lixa de unha, uma resistência de chuveiro, canetas e baralhos. Observe, tudo dentro de um vaso de vidro com apenas uns 15 cm de altura e 10 cm de largura em cima de uma mesinha de centro verde. Tudo na mais perfeita harmonia. O ventilador de um dos quartos liga sozinho, os ratos pensam que a casa e a comida é deles também, e a geladeira precisa ser limpada a cada 7 dias senão fica impossível abrir a tampa, tirar ou por alguma coisa no congelador, sem arrancar algum pedaço de gelo enorme.
Você meu caro leitor imaginário do futuro deve estar se perguntando: e a crise historiográfica? Isso falarei na próxima divagação por que a moradora desta casa que é à que escreve essa divagação cansou e precisa dormir.

Pernilongos II

Espero pela cor
Em vigilia
Os pernilongos somente
Me fazem companhia
Devo aborrecê-los?
Sem piedade, mato-os.
Adormeço.

Esperei por ti
Cor insólita
Todas as horas
Do café à sobremesa
Até os pernilongos foram embora

Esperarei por ti
Cor de afã
Cada manhã
Cada anoitecer
Sem presente e sem futuro
Até morrerem todos os pernilongos.

Pernilongos I

Espero por ti
Brigando com os pernilongos
Olhando para o teto escuro.

Tu não virás.
Penso em mulher.
Acendo a luz.
E tudo me escapa.

Os pernilongos fogem.
Preciso matá-los para te esquecer,
E dormir.

Quadro Inacabado

Preparo-me para a morte
Como quem planta um jardim
Regando cada flor, tranqüilamente.

Preparo-me para a morte
Como a velha reza o terço
Na cadeira de balanço, sonolentamente.

Preparo-me para morte
Ouvindo um blues, pintando um quadro
Desenhando arvores, pedras e beija-flores
Escrevendo poesia.

Preparo-me para a morte
Porque me apaixono todo dia
Porque toda a paixão é uma morte
E todo dia mato um pouco de mim mesma.

Preparo-me para a morte
Porque estou cansada
De múltiplos cansaços
Sem remédio, sem cura.

Preparo-me a morte
Com remorso de tanto que não fiz
De tanto que não falei, que não fui
De tanto que não quis...

Preparo-me para a morte
Fugindo da utopia dos meus sonhos
Sem ideologias, sem perfume, sem platéia.

Preparo-me para a morte
Porque as feridas doem, como doem!
Porque a vida, meu Deus
A vida da câncer.

Preparo-me para a morte
Porque é cruel a evasão do equilíbrio
Do meu corpo, da minha mente
A evasão do mundo...

Preparo-me para a morte
Com a urgência de um feto
Com a paciência de um pintor
E o receio de um escritor.

Preparo-me para a morte
Que talvez nem seja a minha
Nem a de ninguém
Preparo-me para a morte
Sobretudo deste poema
Que anseia por morrer
Inacabado
Inacabado como o quadro na parede.

Quem poderà saber como se sente o pintor

Quem poderá saber como se sente o pintor?
Através da neblina desta tela
O cinza, o azul, o verde.
Por entre os prédios, como se sente?
Por entre as ruas, como se sente?
Quem poderá saber, nesta metrópole?

O que quer o pintor?
Preferiria ser mandado pro inferno,
Jogado no lixo
Quebrado em mil pedaços,
Ser corroído por ácidos?

Quem poderá saber, nestas ruas todas?

Ser cortado por paixões sem piedade?
Ser adotado na própria porta,
ou pelo caminho?

O pintor é frágil.
È forte
É cheio de magoa
E cheio de perdão.
É humano.
Demasiado humano.
E ele sabe disso.
De tudo isso.
Mas, alguém mais sabe?
Alguém mais quer saber?

E assim o pintor encosta a tela
Atrás do armário.
Ninguém sabe.
Nem saberá.

Triste fim de um desconhecido pintor

Mataram o pintor
O pintor esta morto
Morto na frente do quadro
Na frente do quadro inacabado.

Mataram o pintor
Foi um caso de amor
Foi uma espada cravada
No peito. Na dor.

Mataram o pintor
Foi o caso do ano
E a penas uma notícia qualquer
Nas páginas policiais.

Viagem no onibus

Luz amarela que bate na fronte
Faz doer
Olhos e cabeça.

Carros ultrapassam
Vozes não se calam
Destino que não chega.

Vontade de morrer um pouco

Neste dia cinza e quente
Que as nuvens ameaçam chuva
E a chuva demora a cair
Sinto vontade de morrer um pouco

Só um pouquinho
Não precisa morrer de tudo
Ou de todo
Nem precisa ser pra sempre.

Morrer de mansinho
Depois de um gole de coca ou de vinho
Com o vento batendo no rosto...
Vontade de morrer um pouco

Enredo

Noite em fúria
Céu em desespero
Trovões, trovoadas.
Tosse.
Na cozinha sobre a mesa
O chá e a caneta
Mãos relutantes
Dor de cabeça.

É um romance que ficou suspenso
Deixou o poema mal escrito
Uma partida sem adeus
Um aceno sem sorriso.

É um romance que ficou suspenso
No circulo da astrologia
Um signo em desafio
Não serviu de guia.

É um romance que ficou suspenso
Nos cabelos em desalinho
Na letra do seu nome
Nas mensagens de telefone.

É um romance que ficou suspenso
Talvez por ânsia
Talvez por receio
Na dúvida, foi um erro.

É um romance que ficou suspenso
Experiência veio com tormento
Alguns beijos em compenso

É um poema que ficou suspenso
Sem calor e sem apego.

Imaculada

Mãe, que serei eu senão explosão cósmica?
Poeira dispersa
Estrela esquálida
Mente confusa

Impressão imprecisa?

Mãe, diga-me quem sou
Porque já fui a esmo e hoje continuo
Abra as eclusas e me jogue na corredeira
Que é pra ver se eu desperto

Mãe, como um apontamento, um romance, uma paisagem
Talvez eu seja uma questão de tempo.
Uma lápide lisa esperando a inscrição.
Um anúncio aguardando o título e o ponto final.

Mãe, volta e vem me dizer quem sou e como escapo
De ter o coração partido em mil pedaços
Como um vaso de vidro vazio.

Mãe, os dias são uma ânsia desesperada
Por um instante de agonia ausente
Por um lenço na lapela
Uma rosa no cabelo.

Mãe, volta pra casa e me ensina matemática.
É pro concurso
Pra lista do mercado
E pros dias do mês

Porque me perdi nas contas e a calculadora estragou.

Sò lembrarei do meu charuto

Olhando entre a fumaça
Do meu charuto
Vejo-te imperfeita

Meu copo de cerveja
Não mata a sede
Embriagada vejo-te
Duplicada

Meu charuto provoca exclamações
Das bocas mais fechadas-
Nunca viram alguém triste
Fumando charuto?

Meu charuto me celebra
Sua fumaça me absorve
Os outros me detestam
E te vejo
Sem desejo.

Essa festa não diverte
Nem termina
Meu charuto apagou
E desapareces.

Na manhã seguinte
Só lembrarei do meu charuto.

Fantasmas

Imagino fantasmas estranhos
Enquanto não amanhece.

Não amanhece
não me esqueço
E me demito.

Inevitáveis, confusos, intocáveis
Meus fantasmas não me permitem
Sequer dissolvê-los,
Diluí-los ou esquecê-los.

Diabólicos, silenciosos e maquiavélicos
Meus fantasmas são meus tormentos
Sem espaço e em qualquer tempo.

Roubam meus documentos
Meus pincéis
E meus intentos.

No meu quarto, à noite,
Esses malditos
Despertam meu desejo
E invadem meus segredos.

Enchendo de poeira meus cabelos
Transformam minha insensatez
Em tragédia.

Alma em cor

É um quadro sem tela
Sem moldura
É um quadro que me pinto
Linha por traço
Abstrato

É, por vezes, sombrio e vertical
Às vezes sou árvore,
Um céu azul, muito azul.
Às vezes sou apenas uma mão
Um rosto no infinito.
Às vezes sou flor e beija-flor
Sem mais lembranças
Coisas sem sentido
Tinta sem motivo...

No quadro que me pinto
Busco na cor a palavra não dita
O beijo não dado
O sol não posto
Busco na cor a tragédia do cotidiano
O silencio da agonia
A música que emana.
A chuva que cai.
O concerto do erro

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Inverno

Atè tentei com as folhas do outono
Criar uma nova tela
Encontrar um pretexto de denùncia
Talvez um tema de amor
Mas com tanta carencia de mim
Nao diluo a cor
E me levam
Sem que eu queira
E me mandam que eu me obedeça
Mas nao tem maneira
que eu esqueça
Pois acabo sempre latejando de vontade
Disfarçando tanta ausencia
Tremendo de frio.

21/Julho/2005

Elegia Desencantada

Foste tu que nao conheceste
Minha letra ìntima
Por isso nao percebeste
Minha alma tao lìrica.
Entao abraçaste pura e simples
qualquer emoçao de momento
Sem quase algum carinho
Nenhum lugar era perfeito.
Foi por querer te encontrar
com ansia desesperada
que exagerada
te perdi.
Por fim faltam-me as palavras
Fica inquieto meu coraçao
Nao te comove meu olhar
Nem te tocam minhas maos.

02/Maio/2006

Careta

Foi-se meu ultimo cigarro
Que depressao
Este cigarro deixou um amargo sabor na boca
Sabor de desilusao.
Apelo para o papel
Descrevendo minha intuiçao
Fumaça vai indo embora
Amor em dispersao.
Tenho os làbios secos
As maos tremulas em açao
Faltam os cigarros
E o cafè em decantaçao.
Foi-se meu ùltimo cigarro
Ficou a inscriçao
Quatro versos se formaram
No ar da impressao.

27/Julho/2006

27 de Novembro

Novembro sempre foi um mês de preparações a espera de um feliz dezembro. E o dezembro chega quente, musical e verde. Só que neste ano o dezembro será inverno, o verde cinza, a musica baixa. Há qualquer coisa de medíocre nisto porque se não fosse as minhas idéias fixas em um janeiro longínquo, um fevereiro disperso, um março especial, um abril romântico este novembro seria, com certeza, único. Doce, salgado, verde, vermelho. O problema è eu não ter problemas com o paladar, nem com a visão, nem com a audição. O problema, caro leitor, è eu olhar para o caos de novembro e bocejar, olhar para o calendário contando os minutos lembrando daquele outubro todo azul, conversar sobre pontos de fuga com quem não entende nada de pintura, ou de arquitetura pitagòrica. Terminando discutindo com a fumaça do cigarro subindo a janela. Eu vivo um dia por semanas e tem semanas que não vivo um dia. Assim o que era para ser um doce novembro (alusao ao filme) se transforma em vago novembro e o sabor, incolor.Ah, o dezembro também.

27/Novembro/2007

Primavera Muda

Chegou a primavera
Muda
Mudança das cores
Mudos rumores.
Olha a flor
Em silencio.
Silenciosa palavra
Nao sai da boca.
Aumenta a hora no relògio
Dia maior
Noite menor
Na mente paciencia.
Diminue o frio
Coraçao gelado
Na palma o botao
Despedaçado.

20/março/2008

Poesia Familiar


Ele nao esta em casa.
Porque nao chega logo?
Prepara o jantar
Enquanto ensina
O filho a multiplicar.
Ele chega, cansado
Conversa, janta.
Ela conta sobre flores
Ele sobre mudas.
Sobem
Quarto, tv, novela
Ela descansa
Ele se distrai
O cachorro em volta.
O filho projeta naves espaciais
Desenha, pinta
Dorme.
Dia nasce
Ele acorda mais cedo
Ela leva o cao passear
O filho na escola
Vao trabalhar.
Simples assim
O amor vai levando
A vida deles
Sem precisar
De mais porques.

23/Março/2008

Casa Vazia

Ela nao pediu pizza hoje.
Nao riscou o fòsforo para acender o cigarro.
Nao pisou na barata que passou correndo.
Ficou ouvindo o silencio da casa vazia.
Pensou em hipopòtamos porque nao tinha em quem pensar.
Ela desistiu de querer
Aquele amor
Que nao afunda
que nao inunda.
Decidiu viajar sozinha.
Nao pegar na mao.
Nao enganar mais o coraçao.
Ficou ouvindo o silencio da casa vazia.

03/Abril/2008